quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Uso e Abuso da História da Igreja
A história da Igreja Cristã, se corretamente considerada e usada, pode ser uma grande fonte de força, sabedoria e estabilidade para o cristão sério. Por outro lado, a história da Igreja, quando considerada erroneamente e usada de maneira equivocada, pode ser uma pedra de tropeço, uma ocasião de fraqueza e estagnação. Há três atitudes para com a história passada da Igreja que são erradas e que podem somente impedir a força verdadeira e o progresso no testemunho da Verdade. Essas três atitudes são: [1] Romantizando o passado; [2] Absolutizando o passado; e [3] Desdenhando o passado. Consideremos cada uma delas.
1. Romantizando o Passado
Romantizar o passado significa dar-lhe, em nosso pensamento, uma qualidade ideal ou perfeita que de fato ele não possui. Frequentemente isso envolve o anacronismo de ler o presente no passado, em vez de ver o passado e interpretá-lo como aquilo que ele realmente foi.
Dois exemplos dessa tendência vêm à mente. O primeiro consiste em romantizar a antiga Igreja Britânica ou Céltica — os primeiros séculos do cristianismo na Inglaterra e Irlanda — antes da invasão Anglo-Saxã da Inglaterra e antes do domínio do romanismo. Que a Antiga Igreja Britânica ou Cética era naqueles tempos tão pura quanto qualquer parte do mundo cristão, ou até mesmo mais pura que todas as outras, não questionamos. Mas a tentativa de alguns autores retratarem a Antiga Igreja Britânica como essencialmente calvinista na doutrina e presbiteriana na forma de governo, e em cima disso sustentar que ela preservou em alguns lugares uma continuidade ininterrupta da vida corporativa até a Reforma Protestante, ao longo de mil anos da Idade Média, só pode ser considerado como uma romantização da história sem fundamento.
Similarmente, o movimento valdense do norte da Itália tem sido romantizado, nem tanto pelos valdenses em si, mas pelos escritores em países de fala inglesa. A alegação que os valdenses tinham uma vida corporativa distinta quase similar, se não totalmente, ao período apostólico, e continuando claramente ao longo da Idade Média até os tempos de Martinho Lutero e a Reforma, e que durante esse longo período de quase um milênio e meio eles foram sempre distintos do catolicismo romano, é impossível de sustentar por evidência histórica válida. Antes, a evidência real indica que o movimento valdense originou-se no século 12, aproximadamente 400 anos antes de Martinho Lutero e a Reforma Protestante. Além disso, os valdenses não eram evangélicos ou protestantes no sentido apropriado desses termos. É possível — ou até mesmo provável — que eles acreditavam no sacerdócio universal dos crentes. É verdade que eles se opunham a alguns dos abusos e pretensões mais sérias da Igreja de Roma. Mas eles não sustentavam a ênfase e o cerne real do Protestantismo — a doutrina da justificação pela fé somente — de nenhuma maneira consistente ou apropriada, até que aprenderam-na com a Reforma Luterana no século 16. É ainda mais anti-histórico tentar manter que os valdenses medievais eram calvinistas e presbiterianos antes da Reforma. Que eles foram testemunhas notáveis e fieis da verdade de Deus não pode ser negado, e deveríamos honrar a sua memória por isso. Mas é uma romantização imprópria da história considerar esses santos como virtualmente calvinistas e presbiterianos numa Itália e França medieval.
2. Absolutizando o Passado
Absolutizar o passado significa considerar alguma época ou período no passado como ideal e normativo para todos os tempos vindouros. O tempo logo após a morte dos apóstolos, ou o tempo dos grandes Concílios da Igreja Primitiva, ou o tempo de Lutero, Knox e Calvino, ou o tempo da Segunda Reforma e a Assembleia de Westminster, são nostalgicamente considerados como “os velhos e bons dias” e a ideia mantida é a seguinte: que aquilo que a Igreja de nossos dias realmente precisa é voltar em espírito àqueles tempos e ali permanecer. Essa tendência surge de uma falta de perspectiva histórica, frequentemente combinada com um grau considerável de ignorância histórica, e uma falha em reconhecer a imperfeição e o relativismo de todas as realizações humanas, mesmo das melhores e mais nobres feitas em submissão a Deus.
Um exemplo dessa tendência é a noção não incomum de que os credos ou padrões oficiais de uma igreja são sacrossantos e que é algo errado e ímpio procurar alterá-los em algum detalhe, ou mesmo reexaminá-los à luz da Escritura. Essa absolutização do passado conflita inevitavelmente com a autoridade da Escritura como o padrão absoluto de fé e prática. Se há alguns elementos ou fases da história passada da Igreja que devem ser considerados como isentos do julgamento da Escritura, então a Bíblia não é mais a nossa única regra infalível de fé e prática. Se a Escritura é realmente a única regra infalível de fé e prática, então tudo na história da Igreja desde que o Novo Testamento foi finalizado está sujeito ao julgamento de Deus falando na Escritura. Deixamos de honrar a Confissão de Westminster se, por exemplo, atribuímos a ela uma autoridade que pertence somente à Escritura, e assim considerá-la e tratá-la como se fosse infalível. Mas a pessoa que considera ímpio ou profano dizer que tal credo pode ser alterado, sobre a base de um estudo adicional da Bíblia, está tratando esse credo como infalível e dando-lhe uma posição que pertence somente à Palavra de Deus. O presente escritor considera a Confissão de Fé de Westminster a melhor declaração da verdade cristã em forma de credo que já foi formulada. Mas ela não é a Palavra de Deus, e assim não é infalível. Ela foi composta por homens que eram de fato eruditos e piedosos, mas ainda sim falíveis em si mesmos e capazes de erro.
E, novamente, quando as pessoas consideram a Reforma como uma conquista fixa e consumada de uma vez por todas, elas estão absolutizando a história. A Reforma Protestante foi parte de um processo histórico.“Ecclesia reformata reformanda est”— a Igreja, tendo sido reformado, continua sendo reformada. Como a santificação, a reforma da Igreja é um processo sem nenhum ponto final na história.
3. Desdenhando o Passado
Desdenhar ou desprezar o passado é uma reação contra as tendências de romantização e absolutização. A pessoa que desdenha o passado falha em apreciar suas conquistas e valores reais. Isto é, ele fracassa em perceber o que Deus já fez na história passada de sua Igreja.
Alguém disse que “Ninguém jamais aprendeu algo da história exceto que ninguém aprende algo da história”. Em grande medida, vivemos numa era que superestima o presente e despreza o passado. Alguns podem dificilmente mencionar os covenanters escoceses do século 17 e suas lutas sem um sorriso de escárnio. As testemunhas e os mártires recebem um elogio parco por uma atitude que diz, em efeito, “Os covenanters foram importantes sem dúvida, mas…”
Todo verdadeiro progresso está construindo sobre fundamentos lançados no passado. Somente captando e apreciando o passado podemos ter uma atitude verdadeiramente válida para com o presente, e somente assim podemos construir um futuro sólido. A pessoa que diz “História é bobagem” está desonrando a Deus, que por sua obra de criação e providência fez a história aquilo que ela é.
Em nossos dias esse grande monumento histórico da Fé Reformada — a Confissão de Fé de Westminster — foi posto de lado como uma peça de museu por grande parte do corpo presbiteriano na América, e uma “nova confissão” a substituiu como o padrão denominacional realmente em vigor. E essa “nova confissão” é na verdade uma rejeição de grande parte da verdade alcançada e testemunhada na Confissão de Westminster histórica. Isso é verdadeiramente um desdenhar da história.
Não é incomum encontrar pessoas com uma atitude de desdém para com os covenanters escoceses históricos e os antigos pactos escoceses. Não fomos salvos pela história dos covenanters, mas sim pela fé em Jesus Cristo. Mas deixamos de honrar ao Senhor se desprezamos o que ele fez em e por meio do seu povo nos tempos passados.
A atitude desdenhosa tem suas raízes no orgulho — o orgulho da ignorância. Alguém disse que há três tipos de orgulho: orgulho de raça, orgulho de rosto e orgulho de graça,** e esse orgulho de graça é o pior dos três. Mas sem dúvida podemos classificar com esses o orgulho da ignorância como uma das piores formas de orgulho. Há pessoas que de fato se gloriam em sua vergonha, que se orgulham verdadeiramente de que são ignorantes de teologia e história da igreja.
Não somos os primeiros cristãos inteligentes ou fieis que já viveram. Cristo, por meio do seu Espírito, sempre esteve ativo, trabalhando ao longo da história passada de sua Igreja. Prestemos atenção à injunção bíblica de “provar todas as coisas e reter o que é bom”. Não romantizemos o passado, não absolutizemos o passado e não desprezemos o passado. Antes, que possamos avaliá-lo com justiça e valorizá-lo sabiamente, para a honra e glória de Deus.
NOTAS:
* Covenanters: Os membros da Igreja da Escócia que assinaram o Pacto (Covenant) Nacional Escocês de 1638, que os obrigava a manter a Igreja da Escócia como foi organizada durante a Reforma, isto é, presbiteriana. Eles participaram em combate armado em obediência ao pacto assinado.
** O autor usa um jogo de palavras aqui: race, face, grace.
Fonte: Ordained Servant, vol. 5, no. 2 (Abril 1996).
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – 03 de janeiro de 2011.
Provendo uma Família Grande
As Escrituras exaltam repetidamente a bênção em ter filhos e a importância deles para a família e o Reino de Deus. Salmos 127 e 128 declaram que Deus se deleita em abençoar o homem justo dando-lhe uma mulher frutífera e filhos. Sob a ótica deste ensino bíblico, e em conformidade ao próprio amor deles às crianças, muitos cristãos têm sido contemplados com uma família grande.
Um obstáculo na busca dessa bênção são as finanças. Muitos assumem que são incapazes de cobrir os custos, e abandonam a visão. Outros nem mesmo consideraram seriamente ter muitos filhos.
Devemos lembrar que o Deus que declara que filhos são sua recompensa, e convoca marido e mulher para “[serem] férteis”, é o mesmo Deus que declara que irá suprir todas as necessidade de Seus filhos que creem em Sua Palavra e guardam seus mandamentos (Fp. 4.19). Escassez sempre foi um problema em um mundo de recursos limitados, e as circunstâncias não eram essencialmente diferentes nos dias em que o salmista exaltou a bênção de ter muitos filhos. A mesma dificuldade que foi enfrentada por homens na era do Antigo Testamento em prover as necessidades materiais adequadas para uma grande família é enfrentada hoje.
Recursos Financeiros ou as Promessas de Deus?
A questão não é os nossos recursos financeiros, mas a promessa de Deus em prover para Seu povo. Uma das mais importantes dessas promessas encontra-se em Mateus 6.33: “Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.” O contexto de Mateus 6.33 repreende a audiência pela busca de segurança financeira em riquezas tangíveis. Jesus declara que esta é uma esperança falsa; todas as riquezas podem ser perdidas, até mesmo num instante. A verdadeira segurança financeira é encontrada ao fazer da obra do Reino de Deus a prioridade em nossa vida. Se assim fizermos, Deus dá a Sua garantia absoluta de que fará com que todas as nossas necessidades materiais sejam supridas.
O estudo cuidadoso da Escritura revela que ter filhos, muitos filhos, e criá-los na doutrina e admoestação do Senhor é um dos mais significantes trabalhos que um casal pode fazer para o Reino de Deus. Se o marido e a mulher buscam o Reino de Deus através da busca de Sua bênção para terem muitos filhos, então eles têm de Deus a promessa imutável de que Ele proverá para eles e seus filhos!
Pelas bênçãos imensas de Deus, minha esposa, Linda, e eu nos beneficiamos com dez filhos. Somos gratos porque ainda cedo fomos convencidos pela Palavra de Deus que educar muitos filhos piedosos era uma obra essencial ao Reino de Deus, e buscamos Sua bênção para este fim. Apesar de nossos recursos serem poucos, nós oramos e confiamos na promessa de Deus em Mateus 6.33, e através dos anos, à medida que nossa família cresceu, os desafios financeiros também cresceram. Ele nunca falhou conosco.
A Palavra de Deus é verdade. Ao confiar nEle, aqueles que olham para Ele em vez de olhar para seus próprios recursos experimentam o caminhar de fé e o poder de Deus em prover. Quando confiamos e obedecemos a Deus, ainda que nossa fé cambaleie, Ele nunca falha!
Pais Prudentes
Em combinação com a fé nas promessas de Deus, pais que têm uma família grande devem também, de acordo com a Escritura, agir retamente e prudentemente. Através do crescimento da nossa família, o Senhor tem nos ensinado muitos princípios bons e sábios para nos ajudar a permanecer fiéis, e tais princípios não são menos úteis em famílias menores:
1. Aprendemos a estabelecer as prioridades familiares. Recursos financeiros são direcionados primeiro para o que é essencial, extras e não-essenciais vêm em segundo. Deus sempre provê para as nossas necessidades genuínas.
2. Nós aprendemos a melhor entender nossos papéis. O papel do marido é prover para sua família. Ele deve ter o compromisso de trabalhar duro e usar o melhor de sua habilidade naquilo que realiza. O papel da mulher é ser uma gerenciadora dos recursos que seu marido provê. Ela precisa aprender a arte de esticar cada real o quanto possível. Um homem diligente e uma esposa frugal e engenhosa são um time eficaz em prover para uma família.
3. Aprendemos a viver despretensiosamente e contentes. Um estilo de vida modesto, livre do fardo do desejo de se viver além das posses, é essencial. Se estamos descontentes, estamos sob o controle do pecado de “ganância, que é idolatria” (Cl 3.5). Ter uma família grande impõe alguns limites quanto ao que é possível, e estes limites precisam ser alegremente aceitos como parte do nosso chamado para sermos frutíferos e criarmos filhos para o Senhor.
4. Aprendemos a agir prudentemente para estendermos nossos recursos. Nisso há algumas coisas que descobrimos a importância. Primeiro, quando possível, faça você mesmo o trabalho. Pagar pelo trabalho que você mesmo poderia fazer é drenar as finanças. Cozinhe partindo do zero, eduque seus filhos em casa, e faça você próprio os consertos. Segundo, sempre busque o menor preço. Isso significa comprar com desconto em lojas de artigos de segunda mão. É impressionante o quanto se pode economizar. Terceiro, esteja disposto a aceitar roupas dadas por outros. Quando se tem um família grande, pessoas generosas gostam de repassar aos seus filhos as roupas que ficaram pequenas nos filhos deles. Gratamente receba esses presentes, e você pode se ver dificilmente comprando uma roupa. Quarto, aprenda a arte do custo-benefício da saúde e da cura. Custos médicos podem ser uma despesa muito grande. Muitos desses custos podem ser evitados se aprendermos prevenção e cura por meio de uma dieta saudável e remédios que não precisam de receita médica. Quinto, não se endivide. Isso é extremamente importante. Dívida no cartão de crédito e juros de empréstimos para itens que se depreciam são como um gafanhoto comendo toda a nossa posse. Sexto, se não pode pagar, fique sem. Isso não apenas ajuda a evitar as dívidas e um orçamento minguado; isso ensina a você e aos seus filhos o domínio-próprio e o contentamento.
5. Nós aprendemos a pedir a Deus que provesse. Deus se agrada em responder orações como estas. Muitas vezes, minha esposa e eu sentíamo-nos pressionados e buscávamos o Senhor para suprir nossas necessidades. Todas as vezes Ele proveu a nós; algumas vezes ao mostrar-nos um caminho que não havíamos considerado, algumas vezes provendo um trabalho ou renda extra, e outras vezes através das dádivas de outros.
O Rev. Moses Brown teve doze filhos. Um dia, um homem que pensava em como ele provia a eles disse-lhe: “Senhor, tens tantos filhos quanto Jacó.” Rev. Brown respondeu: “Sim, e tenho o Deus de Jacó para prover a eles.” Joseph Hall disse, certa feita: “Lembro-me de um grande homem vindo à minha casa em Waltham, e vendo todos os meus filhos em pé em ordem de idade e altura, disse: ‘Estes são aqueles que fazem de um homem rico pobre.’ Mas imediatamente ele recebeu esta resposta: ‘De modo algum, meu senhor. Estes são aqueles que fazem um de homem pobre rico; pois eu não me desfaria de sequer um destes por toda a sua riqueza.’” [1]
NOTAS:
1. Charles Haddon Spurgeon, Psalms, ed. Davis Otis Fuller (Grand Rapids: Kregel Publications, 1976), 593.
Tradução: Jazanias Oliveira – dezembro/2011
O Vinho e o Irmão Mais Fraco
“Bom é não comer carne”, diz o apóstolo Paulo, “nem beber vinho, nem fazer outras coisas em que teu irmão tropece, ou se escandalize, ou se enfraqueça” (Rm 14.21). Essa declaração é frequentemente citada por aqueles que querem fazer da abstinência total um requerimento para o cristão. Eles argumentam que é dever do forte abster-se por consideração ao fraco. Eles dizem, em outras palavras, que mesmo um uso cuidadoso e moderado do vinho contradiz esse princípio apostólico. É a esse argumento que daremos agora a nossa atenção. Fazemos isso propondo duas perguntas. O que Paulo quer dizer por irmão mais fraco nesta passagem? E o que ele quer dizer quando fala sobre fazer esse irmão tropeçar?
O fato é que Paulo quer dizer algo muito diferente nesta frase “irmão mais fraco” do que os proponentes da abstinência total querem dizer. Quando falam de um irmão mais fraco, eles querem dizer alguém que tem uma tendência a beber muito. Um homem que tenha sido alcoólatra, por exemplo, e agora está procurando permanecer sóbrio, mediante a prática de abstinência completa, seria um irmão mais fraco, conforme eles usam essa frase. Mas o irmão mais fraco na terminologia de Paulo não é um homem que tende a beber muito. Pelo contrário, ele é um homem que acha errado beber qualquer quantia de vinho. Ele é um homem que tem certo escrúpulo de consciência. Se certos tipos de carne e vinho fossem realmente maus per se, então não seria necessário falar de tais pessoas como irmãos mais fracos. Mas o fato é que não existe nenhuma carne ou vinho que seja mau em si mesmo. Assim, o irmão mais forte é aquele que reconhece que isso é verdade. O irmão mais fraco é mais fraco porque ele está equivocado em sua convicção. Se come, ou bebe, ele peca. O pecado não reside no mero ato físico de comer ou beber como tal. Ele reside no fato que o irmão mais fraco, ao comer ou beber, violou a sua própria consciência. Pois, como diz Paulo, “tudo o que não é de fé é pecado” (Rm 14.23). A definição de Paulo para irmão mais fraco é, portanto, o exato oposto daquilo que é proposto pelos defensores da posição da abstinência total. Colocando de forma mais precisa: o irmão mais fraco, na terminologia de Paulo, é alguém que defende a posição de abstinência total. Sua fraqueza é que ele erroneamente crê que o beber vinho é um pecado.
Disso pode ser facilmente visto que quando Paulo fala de fazer um irmão tropeçar, ele não quer dizer nada semelhante àquilo defendido pelos proponentes da abstinência total. Quando eles dizem que não devemos fazer o nosso irmão tropeçar, eles simplesmente querem dizer que não devemos fazer algo que eles não gostam. Não devemos nos envolver em nenhum comportamento que seja ofensivo a outros crentes. Ou em outras palavras, nunca devemos fazer algo que outros crentes consideram ser pecado. Ora, isso não é o que Paulo quer dizer. Quando ele falou de fazer um irmão tropeçar, ele quis dizer um ato da nossa parte que induza nosso irmão a pecar — que o encoraje a agir contra esse escrúpulo que ele tem em sua consciência. Sem dúvida, aquilo que Paulo está dizendo pode — em certas circunstâncias — ditar que não devemos fazer algo que seja intrinsecamente legítimo. Se certo cristão foi um alcoólatra, e agora crê que qualquer quantidade de vinho para ele seria o caminho de ruína, então outros cristãos devem certamente fazer disso a preocupação deles também. Eles devem ser cuidadosos para que não ajam de uma forma que o encoraje a ir contra a sua própria consciência. Isso não significa que eles devem adotar a regra da consciência dele como lei.
Podemos facilmente ver isso se simplesmente observarmos que Paulo também fala da observância religiosa de dias (Rm 14.6). É um fato bem conhecido que nenhum dia era observado na Igreja Apostólica, por mandamento divino, exceto o Dia do Senhor (1Co 16.1,2; Gl 4.9-11). Quando os judaizantes tentaram impor a observância de outros (adicionais) dias, o apóstolo se opôs tenazmente (Gl 4.9-11). Todavia, nessa questão também Paulo não teve compaixão por aqueles que eram irmãos mais fracos. O irmão mais fraco neste caso era alguém que se sentia obrigado a observar esses outros dias. (Pense nos judeus que ainda se sentiam obrigados, pela consciência, a observar os tradicionais dias de festas judaicos!) O problema, novamente, era uma consciência mal informada que ia além da lei do Senhor. Alguém pensa que Paulo exigiu que o forte se conformasse ao fraco? Não, o fato é que quando a tentativa de forçar tal conformidade foi feita, o apóstolo a denunciou severamente. Pois uma coisa é receber o irmão mais fraco (Rm 14.1) e outra bem diferente é permitir que sua fraqueza seja imposta sobre os outros como lei (v. 4).
Aconteceu exatamente a mesma coisa com a comida. Nos dias de Paulo — como nos nossos — algumas pessoas tinham escrúpulos de consciência contra comer certos tipos de carne (porco, por exemplo). Embora errados por ter esses escrúpulos, eles ainda sim deveriam ser recebidos como irmãos (v. 3). Os fortes não deveriam tentar induzi-los a comer contra convicção de consciência. Quem argumentaria que era dever do forte se conformar ao fraco? Os proponentes da abstinência total se submetem a tais escrúpulos? Não, o fato é que as mesmas pessoas que tentam usar esse argumento para forçar outras pessoas a praticar a abstinência total, quando diz respeito ao vinho, não praticam o que pregam quando diz respeito a carne de porco. Não é de admirar! Se os cristãos fossem obrigados a se abster — completamente — de qualquer comida ou bebida que irmãos fracos, num momento ou outro, num lugar ou outro, consideram como sendo pecaminosas, eles teriam pouca opção quanto ao que comer e beber. Por que então essa passagem deveria ser tomada dessa forma com respeito ao vinho? A passagem, afinal, não diz que é mau comer carne ou beber vinho. Ela diz apenas que é bom não comer carne ou beber vinho se isso faz um irmão tropeçar. A única preocupação de toda a passagem é nos ensinar a evitar algo que induza um irmão mais fraco a agir contra a sua própria consciência.
Quando Paulo diz “bom seria que o homem não tocasse em mulher” (1Co 7.1), ele não quer dizer que a relação sexual é inerentemente errada. Pelo contrário, para evitar a imoralidade sexual, ele recomenda a relação sexual — dizendo que cada homem tenha a sua própria esposa e cada mulher o seu próprio marido, caso não tenham o dom da continência. O oposto da imoralidade sexual não é necessariamente o celibato. Dizer que a abstinência total (sexual) é boa, não é de forma alguma o mesmo que dizer que a satisfação legítima é má. Muito pelo contrário: embora a abstinência completa possa ser melhor para alguns, uma satisfação apropriada é o melhor para outros. De fato, para a maioria das pessoas o conveniente não é a abstinência, mas o uso lícito. Todavia, essa é a distinção que os proponentes da proibição ignoram. Eles condenam o uso do vinho, mesmo com moderação, sobre o fundamento que ele poderia fazer outra pessoa tropeçar. É interessante observar que algumas pessoas na igreja antiga fizeram exatamente a mesma coisa com respeito ao casamento. Porque a Escritura diz “bom seria que o homem não tocasse em mulher”, eles começaram a exigir que as pessoas praticassem o celibato (1Tm 4.3). Como os defensores atuais da abstinência total, eles procuraram tornar um escrúpulo de suas próprias consciências algo obrigatório para todos os demais. Mas Paulo, profeticamente falando, classifica o ensino deles como vindo de espíritos enganadores, e como doutrina de demônios, e não de Cristo (v. 1). Ele não louva a convicção de consciência deles, mas antes descreve as suas consciências como tendo sido cauterizadas (v. 2). Ao proibir o casamento, e ao ordenar a abstinência de certos alimentos, eles na verdade estavam impugnando a obra das mãos de Deus (v. 3, 4). Pois Deus criou todas essas coisas para serem recebidas com ações de graça, por aqueles que creem e conhecem a verdade.
O mesmo se dá com o vinho. Aqueles que procuram impor seu escrúpulo de consciência nos outros usurpam a autoridade de Cristo. Paulo nos ensina a resistir-lhes. “A fé que tens”, diz ele, “tenha como sua convicção diante de Deus” (Rm 14.22).
Fonte: Wine in the Bible & the Church, p. 17-21.
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – 03 de janeiro de 2011.
O Uso do Vinho na Ceia do Senhor
A Sessão da Michiana Covenant Church sustenta que o uso do vinho na Santa Ceia, tendo sido instituído por Cristo, é conveniente e apropriado. O uso de suco de uva, embora não seja pecaminoso, desvia-se da prática bíblica. Em suporte da nossa posição, oferecemos as seguintes considerações:
O vinho, usado apropriadamente, é uma bênção de Deus
Deus dá “o vinho que alegra o coração do homem”, assim como ele dá “o pão que fortalece o coração do homem” (Sl 104.14,15). Deus promete ao seu povo obediente que Ele o abençoará com uma abundância de vinho (Dt 7.13, 11:14; Pv 3.10). Usado incorretamente, o vinho torna-se uma maldição (Pv 23.29-35). A Bíblia condena uniformemente a embriaguez (1Co 5.11, 6.10; Ef 5.18; Gl 5.21).
Salmos 104.14-15 – “Faz crescer a erva para o gado, e a verdura para o serviço do homem, para fazer sair da terra o pão, e o vinho que alegra o coração do homem, e o azeite que faz reluzir o seu rosto, e o pão que fortalece o coração do homem.”
Deuteronômio 7:13 – “E amar-te-á, e abençoar-te-á, e te fará multiplicar; abençoará o fruto do teu ventre, e o fruto da tua terra, o teu grão, e o teu mosto, e o teu azeite, e a criação das tuas vacas, e o rebanho do teu gado miúdo, na terra que jurou a teus pais dar-te.”
Deuteronômio 11.14 – “Então darei a chuva da vossa terra a seu tempo, a temporã e a serôdia, para que recolhais o vosso grão, e o vosso mosto e o vosso azeite.”
Provérbios 3.10 – “E se encherão os teus celeiros, e transbordarão de vinho os teus lagares.”
1 Coríntios 5.11 – “Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou be-berrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais.”
1 Coríntios 6.10 – “Não erreis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus.”
Efésios 5.18 – “E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito.”
Gálatas 5.21 – “Invejas, homicídios, bebedices, glutonarias, e coisas seme-lhantes a estas, acerca das quais vos declaro, como já antes vos disse, que os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus.”
O vinho, como mencionado na Bíblia, contém álcool
A Bíblia não traça nenhuma distinção entre vinho e suco de uva ou entre vinho fermentado e vinho não fermentado. O mesmo vinho (hebraico yayin) que deixou bêbado Noé (Gn 9.21), Ló (Gn 19.32-35), Nabal (1Sm 25.37), Assuero (Et 1.7, 10), e outros (Is 28.1, 7; Jr 23.9), foi dado a Abraão por Melquisedeque (Gn 14.18), mantido nos armazéns dos reis de Israel (1Cr 27.27; 2Cr 11.11; Ne 5.18) e permitido a todo o povo de Deus (Dt 14.26).
Gênesis 9.21 – “E bebeu do vinho, e embebedou-se; e descobriu-se no meio de sua tenda.”
Gênesis 19.32-35 – “Vem, demos de beber vinho a nosso pai…”
1 Samuel 25.37 – “Sucedeu, pois, que pela manhã, estando Nabal já livre do vinho, sua mulher lhe deu a entender aquelas coisas; e se amorteceu o seu coração, e ficou ele como pedra.”
Ester 1.7, 10 – “E dava-se de beber em copos de ouro, e os copos eram diferentes uns dos outros; e havia muito vinho real, segundo a generosidade do rei… E ao sétimo dia, estando já o coração do rei alegre do vinho, mandou a Meumã, Bizta, Harbona, Bigtá, Abagta, Zetar e Carcas, os sete camareiros que serviam na presença do rei Assuero.”
Isaías 28.1 – “Ai da coroa de soberba dos bêbados de Efraim, cujo glorioso ornamento é como a flor que cai, que está sobre a cabeça do fértil vale dos vencidos do vinho… Mas também estes erram por causa do vinho, e com a bebida forte se desencaminham; até o sacerdote e o profeta erram por causa da bebida forte; são absorvidos pelo vinho; desencaminham-se por causa da bebida forte; andam errados na visão e tropeçam no juízo.”
Jeremias 23.9 – “Quanto aos profetas, já o meu coração está quebrantado dentro de mim; todos os meus ossos estremecem; sou como um homem embriagado, e como um homem vencido de vinho, por causa do SENHOR, e por causa das suas santas palavras.”
Gênesis 14.18 – “E Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; e era este sacerdote do Deus Altíssimo.”
1 Crônicas 27.27 – “E sobre as vinhas, Simei, o ramatita; porém sobre o que das vides entrava nas adegas do vinho, Zabdi, o sifmita.”
2 Crônicas 11.11 – “E fortificou estas fortalezas e pôs nelas capitães, e ar-mazéns de víveres, de azeite, e de vinho.”
Neemias 5.18 – “E o que se preparava para cada dia era um boi e seis ove-lhas escolhidas; também aves se me preparavam e, de dez em dez dias, muito vinho de todas as espécies; e nem por isso exigi o pão do governador, porquanto a servidão deste povo era grande.”
Deuteronômio 14.26 – “E aquele dinheiro darás por tudo o que deseja a tua alma, por vacas, e por ovelhas, e por vinho, e por bebida forte, e por tudo o que te pedir a tua alma; come-o ali perante o SENHOR teu Deus, e alegra-te, tu e a tua casa.”
Jesus usou vinho na Última Ceia
A Última Ceia foi instituída com vinho, não suco de uva. Não havia disponibili-dade de suco de uva não fermentado durante a primavera na antiga Palestina, muitos meses após a colheita da uva. Carecendo de refrigeração ou pasteurização, o suco teria fermentado rapidamente. Jesus falou do “cálice” como cheio do “fruto da vide” (Mt 26.29; Marcos 14.25; Lucas 22:18) para designar o vinho usado na Páscoa e na noite do Sabbath. Não existe nenhuma indicação na Bíblia que o nosso Senhor realizou um milagre e criou suco de uva novinho para a primeira Santa Ceia. E fica claro que os apóstolos ensinaram à Igreja o uso de vinho na ceia pelo fato de alguns ficarem embriagados na celebração da Santa Ceia (1Co 11.21).
Mateus 26.29 – “E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vi-de, até aquele dia em que o beba novo convosco no reino de meu Pai.”
Marcos 14.25 – “Em verdade vos digo que não beberei mais do fruto da vide, até àquele dia em que o beber, novo, no reino de Deus.”
Lucas 22.18 – “Porque vos digo que já não beberei do fruto da vide, até que venha o reino de Deus.”
1 Coríntios 11:21 – “Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome e outro embriaga-se.”
A importância do vinho na Santa Ceia
O vinho, muito mais do que o suco de uva, simboliza o sangue de Cristo, que foi derramado por nossos pecados. É o corpo glorificado e o sangue de Cristo que nos trazem a bênção do eschaton. A semelhança do vinho com o sangue de Cristo não encontra-se apenas em sua cor, mas de maneira mais importante em seu poder para alegrar o coração do homem.
É por isso que o conteúdo alcoólico do vinho, resultado da transformação pela fermentação, é importante. A “glorificação alcoólica” do suco de uva tem importância teológica e escatológica. Da mesma forma que o fraco suco de uva dá lugar para o vinho da bênção, a antiga aliança dá lugar para a nova e melhor aliança. O suco de uva está morto, mas o vinho passou da vida para a morte por meio da fermentação.
A pasteurização, processo criado pelo homem através do qual o suco de uva é fabricado, interrompe o processo de fermentação ordenado por Deus, matando o agente daquela transformação. Há uma conexão entre a produção moderna de suco de uva e a hermenêutica moderna extra-bíblica que requer o uso desse suco na Santa Ceia, ambas inovações do século 19. Ao burlar o desenvolvimento do suco de uva em vinho, mutilamos o significado biblicamente atribuído deste cálice de bênção.
Portanto, a sessão determinou o retorno da prática de usar vinho na Ceia do Senhor. Todavia, para o bem daqueles que possuem consciências fracas, a sessão também mantém o uso do suco de uva por enquanto.
Fonte: The Pattern of Worship at Michiana Covenant Church.
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – 04de janeiro de 2011.
Cristianismo, a Mãe da Liberdade Política
A força política mais libertadora na história da humanidade tem sido o cristia-nismo (Jo 8.36). O cristianismo ramificou-se do tronco da religião hebraica piedosa do Antigo Testamento, e a antiga nação hebraica (antes da era dos reis [1Sm 8]) foi sem dúvida a sociedade mais libertária na história da humanidade. O cristianismo herdou da fé veterotestamentária a crença inabalável no Deus soberano e transcendente, que está acima de todos e julga toda a humanidade, incluindo seus sistemas de governo civil. A ordem política nunca é suprema.
1. O Mundo Antigo
O cristianismo destruiu a unidade do antigo mundo pagão. A fonte dessa uni-dade era o Estado, geralmente identificado com a própria sociedade, no topo do qual estava um grande líder político, um rei ou imperador, que pensava ser um deus ou semelhante a deus. A unidade do antigo mundo pagão consistia na divinização da ordem temporal na forma do Estado.
Mas o cristianismo reconhecia “outro rei” (At 17.7). Embora não por meios a-narquistas, os primeiros cristãos reconheciam que nenhuma autoridade terrena, es-pecialmente autoridade política, poderia ser suprema, pois somente a autoridade de Deus é suprema.
Ao esclarecer a cristologia (a doutrina de Jesus Cristo) ortodoxa, o Concílio de Calcedônia (451 a.C.) lançou o fundamento da liberdade ocidental. Apenas Jesus Cristo é divino e humano, plenamente Deus e plenamente Homem, a única ligação entre céu e terra. Ele é o único Mediador divino-humano. Essa decisão repudiava dramaticamente toda divinização da ordem temporal. Nenhum Estado, nenhuma igreja, nenhuma família, poderia ser Deus ou semelhante a Deus.
Esse reconhecimento colocou o cristianismo patrístico em rota de colisão com a política clássica. Os primeiros cristãos foram perseguidos de maneira selvagem, não porque adoravam a Jesus Cristo, mas porque recusavam adorar ao imperador romano. As sociedades politeístas encorajam a adoração de divindades. Elas resistem à exclusão de todas as divindades, particularmente o Estado, excetuando-se a Divindade verdadeira, o Deus da Bíblia.
2. O Mundo Medieval
No mundo medieval, a Igreja Latina tornou-se uma força de compensação na sociedade, verificando e limitando a autoridade do Estado. De fato, na maior parte do tempo, o tamanho e a força da igreja excederam em muito a de qualquer Estado em particular. Lord Acton estava correto ao sugerir que a prática da liberdade política no Ocidente surgiu, em grande parte, a partir deste conflito medieval Igreja-Estado. Em adição, o mundo medieval, a despeito dos seus muitos defeitos, apoiou uma grande medida de liberdade política ao promover várias instituições humanas além da igreja que alegavam fidelidade ao homem: a família, a confraria, o senhor feudal, e assim por diante. Isso significou que o Estado tinha de compartilhar sua autoridade com outras instituições igualmente legítimas. Nenhuma instituição humana pode exercer autoridade suprema.
3. O Mundo Moderno
As limitações constitucionais do poder político, das quais surgiu a prática de democracias constitucionais dos séculos 18 e 19, começaram na Inglaterra cristã com a Carta Magna. A Inglaterra também realizou o primeiro ataque bem sucedido contra a doutrina maligna do direito divino dos reis durante a Revolução Puritana na primeira metade do século 17; e em 1688-89, durante a Gloriosa Revolução de Guilherme e Maria, ela colocou o último prego no caixão desta ameaça duradoura à liberdade política. A fundação dos Estados Unidos foi a maior experiência em liberdade política daquele tempo, e ela funcionou conscientemente com base em certas premissas distintamente cristãs.
Os Fundadores, por exemplo, reconheceram a doutrina bíblica do pecado original e da depravação humana, e portanto criaram um sistema de governo civil que dividiu a tomada de decisão entre vários ramos e que não outorgou muito poder a nenhum ramo do governo civil. Segundo, eles argumentaram que o papel do governo civil é assegurar os direitos de “vida, liberdade e felicidade”, com os quais Deus, como Criador, dotou todos os homens. Em terceiro lugar, reconhecendo a doutrina bíblica de que o governo civil deveria proteger as minorias (Ex 23.9), eles elaboraram uma constituição à qual juntaram uma Declaração de Direitos, inibindo assim o surgimento de uma tirania resultante de uma rápida mudança política segundo o capricho da opinião democrática.
A liberdade política como refletida na separação de poderes, bem como nas fiscalizações e contra balanços; o papel do Estado em proteger a vida, liberdade e propriedade; e a proteção constitucional dos direitos das minorias – todos estes fo-ram legados do cristianismo ao mundo moderno.
4. A que ponto chegará o Ocidente?
Hoje o Ocidente definha sob a violência do aborto e eutanásia, a praga do homossexualismo, a pobreza do materialismo, a coerção do socialismo, o domínio da educação “pública”, o caos do ativismo judicial, e a injustiça do racismo e sexismo impostos. Essas tiranias são todas o resultado direto do abandono do cristianismo bíblico. O mundo ocidental tem aceitado crescentemente a proposta daquele primeiro político liberal moderno, Jean Jacque Rousseau: o Estado emancipará você da responsabilidade para com todas as instituições humanas não coercivas, como a família, igreja e os negócios, se apenas você submeter-se à coerção do Estado. O homem moderno está disposto a negociar a sua responsabili-dade para com a família, igreja e os negócios, trocando-a por submissão a uma ordem política crescentemente coerciva e violenta. Estamos retornando ao mundo pagão clássico, no qual o Estado coercivo é o princípio unificador de tudo na vida.
Os regimes políticos mais cruéis, violentos e assassinos na história da humani-dade tem sido os não-cristãos ou anti-cristãos: o humanismo pagão primitivo dos antigos Egito, Babilônia, Pérsia, Grécia e Roma, e o humanismo secular sofisticado da França revolucionária, União Soviética, China Vermelha, Alemanha Nazista, Itália Fascista, e outros estados seculares modernos. O humanismo é e sempre será uma receita para o terror e tirania políticos.
A única esperança para o retorno da liberdade política e da sociedade livre que ela promove é um retorno ao cristianismo bíblico e ortodoxo. O cristianismo não é meramente uma matriz na qual a liberdade política floresce; ele é o único fundamento sobre o qual se pode construir uma sociedade livre.
Fonte: www.lewrockwell.com
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – 05 de janeiro de 2011.
Revisão: Jazanias Oliveira
Pós-Milenismo Reconsiderado
Ao descrever o pós-milenismo, deveria ser observado em primeiro lugar que há uma grande área de concordância entre pré-milenistas, amilenistas e pós-milenistas clássicos.
Todos os cristãos deveriam concordar que a igreja, chamada “a Noiva” e “a Nova Jerusalém” em Apocalipse 20, existe tanto no céu como na terra antes da Segunda Vinda. Deveríamos concordar que Apocalipse 20 descreve o ataque final das forças de Satanás contra Cristo e a igreja no fim da história. Todos os cristãos deveriam concordar que Cristo retornará em forma corporal no fim da história para julgar os vivos e os mortos.
Deveríamos concordar que os eventos que devem preceder a Segunda de Jesus são os seguintes:
1. A difusão universal do Evangelho ocorrerá na história resultando na salvação de muitas almas – ou, como nosso Senhor expressa, o “ajuntamento dos seus eleitos” (Mt 24.31). Esse é o chamado e propósito primário da Igreja – “fazer discípulos de todas as nações” (Mt 28.18,19).
2. Com a expansão do Evangelho e a influência de homens e mulheres de Deus santificados na sociedade, longos períodos de paz e bênção econômica nas nações cristãs resultarão na propagação adicional do Evangelho em áreas não convertidas da Terra. Deveria ser observado que o ponto onde os pós-milenistas diferem de seus irmãos amilenistas e pré-milenistas: a visão do Reino de Deus como sempre se expandindo e da Igreja como o grande motor para aumentar as bênçãos, a paz e a prosperidade nas nações da Terra.
3. A conversão dos judeus étnicos deve ser nacional. Assim como a rejeição deles foi nacional, embora um remanescente tinha sido salvo; assim a conversão deles será nacional, embora alguns possam permanecer endurecidos (Romanos 11:25,26; Atos 28.25-29).
4. Após a Grande Comissão ser cumprida, haverá uma apostasia ou deserção geral, que ocorrerá por um breve tempo antes da Segunda Vinda do Senhor (Ap 20.7-9).
Deveríamos concordar que os seguintes eventos na Segunda Vinda de Jesus Cristo ocorrerão mais ou menos simultaneamente no fim da história.
1. A ressurreição dos mortos, justos e ímpios.
2. O julgamento final.
3. O fim do mundo.
4. A consumação do reino de Cristo.
O que acabei de esboçar aqui é chamado “doutrina comum da igreja”, pois tem sido a ideia prevalecente entre todos os cristãos durante quase 2000 anos. De fato, nos primeiros séculos da história da igreja a doutrina comum nem sequer tinha um nome. Não havia nenhuma diferenciação elaborada das teorias milenaristas tais como temos hoje. Tratava-se simplesmente da declaração ampla de fé do Credo dos Apóstolos, do Credo Niceno e dos ensinos dos pais da igreja: que Cristo virá novamente para julgar os vivos e os mortos, quando haverá uma ressurreição final de todas as almas que já viveram no planeta terra.
Mas para evitar uma digressão adicional, retornarei a uma exposição plena do que significa o “reinado de mil anos de Cristo” de Apocalipse 20, a partir de uma perspectiva pós-milenista, em outro artigo.
Fonte: www.forerunner.com
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – 07 de janeiro de 2012
O Deus do Processo
As origens do modernismo remontam aos primeiros ataques sobre Gênesis 1-11, e sobre a lei mosaica. Esses eram vistos como evidência dos mitos primitivos e da lei primitiva. O século dezenove via muito interesse nos antigos códigos legais; esses supostamente mostravam elementos comuns com a lei mosaica, e dessa forma foi sustentado que a lei mosaica era derivada, não original. Similarmente, mitos em todo o mundo sobre a criação, um dilúvio universal e coisas similares, supostamente provavam a natureza mitológica do relato bíblico; parece que não ocorreu a esses estudiosos que o relato bíblico fosse verdadeiro, e os outros deri-vados deste.
Vemos hoje um desenvolvimento similar nos círculos evangélicos e reforma-dos. Primeiro, a lei de Deus foi abandonada como pertinente apenas às tribos hebraicas e, portanto, “primitiva” e rural em sua orientação. Mas a lei é a vontade do Soberano para o seu povo, e abandonar a lei de Deus é negar-lhe soberania. Dessa forma, não é surpresa que muitos círculos dentro do fundamentalismo, tendo negado a lei de Deus, têm negando qualquer Senhorio atual a Jesus Cristo. Se ele não tem nenhuma lei agora, ele não pode ser Senhor. Dessa forma, a lógica do mundo de Deus tem levado muitos antinomianos, se não quase todos, a negar o Senhorio a Jesus Cristo.
Em alguns círculos evangélicos e reformados, bem como em outras tradições teológicas, há hoje um antinomianismo militante e uma hostilidade à historicidade de Gênesis 1-11. Alguns pastores expressam abertamente o seu desprezo por aqueles que defendem Gênesis capítulos 1 ao 11. Supostamente, os que aceitam a Escritura têm lido ingenuamente material simbólico como se fosse história. Sem dúvida, o texto bíblico fala claramente como história, e enfatiza os dias da criação como dias reais de 24 horas.
Tal abordagem tem grandes implicações para a teologia e interpretação bíbli-ca. Se Gênesis capítulos 1 ao 11 não são história literal, por que não ler os relatos da ressurreição como simbólicos também? Certamente os relatos do nascimento virginal soam às vezes como poesia, então por que não chamá-los de simbólicos também?
Os campões da visão simbólica desprezam aqueles que afirmam a historicida-de de Gênesis 1-11. Seus argumentos contra Gênesis 1-11 são vagos e capciosos, mas o seu desprezo é muito real. Tendo em efeito adotado uma visão não bíblica de Deus, eles não podem admitir a veracidade da sua Palavra. O deus deles é o processo, não o Criador.
Deus como processo é básico para aqueles que querem a evolução juntamente com uma fé religiosa que de alguma forma retenha o conceito deus. A evolução é um processo cujo deus é o tempo. A alternativa ao Deus bíblico é o acaso, e, há tempos, tem sido sustentado que, tendo tempo suficiente, o acaso poderia realizar qualquer coisa. Julian Huxley e outros têm mantido essa visão; tendo tempo suficiente, qualquer coisa pode acontecer num mundo de acasos. Se um grande número de macacos escrevessem em máquinas datilográficas por um tempo sem fim, eles eventualmente reproduziriam todas as obras de Shakespeare. Mas essa ilustração famosa é uma farsa. Ela pressupõe vários macacos, máquinas de escrever e armazéns cheios de papéis, os quais de alguma forma alimentariam as máquinas de datilografia. De onde vêm todas essas coisas? E o que mantém os macacos nas máquinas de escrever por anos, e evita que eles as destruam? Essa ilustração absurda desmente o acaso e a evolução. De tais suposições ridículas o mito da evolução é construído.
O deus da evolução é o processo; o processo requer bilhões de anos, e isso é assumir demais. De alguma forma, um átomo original veio à existência, possuindo em si mesmo toda a potencialidade desse cosmos e todavia inconsciente, um deus tão grande quanto o Deus bíblico, mas convenientemente sem consciência ou tribu-nal! Que Deus conveniente para pecadores!
Não se engane sobre isso. Esses pastores piedosos, que querem que nós as-sumamos as visões mais “inteligentes” deles sobre Gênesis 1-11, estão ocupados em fazer deuses para nós! Não surpreendentemente, um teólogo ortodoxo oriental que promovia tais visões expressava abertamente o seu desprezo pelo “biblicismo” e “bi-bliolatria”, mas promovia outro deus e uma igreja apropriadamente estética! Ele considerava o Protestantismo com sua fé na Escritura como “primitivo”.
Embora esses tolos letrados estejam ocupados em nos condenar, temos o fato interessante da perspectiva deles ser uma de derrota, como pessoas que negam seus próprios artigos de religião e a sua carta régia, a Bíblia.
Lembre-se que muitos dos “pais” da igreja primitiva, sendo greco-romanos em sua perspectiva, achavam a Bíblica dolorosamente “ingênua” para intelectuais como eles. A igreja cresceu a despeito deles, pois havia o suficiente de pessoas “simples” que tomaram a palavra de Deus séria e literalmente. O futuro não pertence a homens que odeiam o Deus vivo, pois o deus do processo que eles têm não pode criar nem salvar. Sem dúvida, o deus que os pecadores desejam é um que lhes permita serem criadores, os arquitetos de uma nova ordem mundial. Os capitólios do mundo estão cheios de tais deuses, assim como as vilas e cidades. Mas devem as igreja estar cheias deles também?
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